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Antes tarde do que mais tarde

16 de agosto de 2021

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Antes tarde do que mais tarde

E se for tarde demais? Talvez essa seja uma das perguntas que mais reverberam dentro da mente de uma pessoa trans que já alcançou a meia idade.

Esse foi o meu caso, há cerca de 3 anos resolvi que estava na hora de ser eu mesma. Mas a pergunta estava lá. E se for tarde demais para começar uma terapia hormonal, e se for tarde demais para eu ter algum grau de feminilidade?

A gente nunca está preparada, os medos, os anseios são enormes. A gente realmente não entende o quão vantajoso é. A gente tem medo de tudo, da rejeição, da solidão, de ser demitida. A gente tem medo da própria sombra do passado.

Simplesmente temos receio de sair da letargia, medo de viver a sua plenitude. O que é pior ser uma figura pálida imersa nos medos e angústias ou ser você plenamente? Eu resolvi acreditar que era possível, eu simplesmente dei o famoso “salto de fé”. Eu estava desiludida, me olhava no espelho e cada dia os efeitos da testosterona eram mais agressivos.

Depois de quarenta anos o que me restava? Afinal a expectativa de vida de uma pessoa no Brasil se aproxima dos 80 anos, portanto teria metade da vida ainda para me lamentar de nunca ter tentado, ou tentar e ter um gostinho de liberdade.

Eu optei pela segunda via, aquela que me conduzia ao desconhecido. Afinal de contas o outro caminho me levou justamente aonde eu não queria chegar, o outro caminho me levou a um lugar que nunca mais quer retornar. Viver minha real existência tem um preço, mas estou disposta a pagar, por cada um desses momentos.

Cerca de 18 meses atrás dei início a essa jornada com terapia hormonal. Estava cética, desmotivada, estava no momento de “tudo que vier é lucro”, mas digo de verdade estou muito no lucro, tudo que consegui foi uma existência real. Mesmo vivendo numa pandemia, vivendo numa liberdade condicional, a prisioneira era eu, não mais alguém que vivia numa prisão sem muros, mas alguém que poderia ir pelo menos à farmácia, ao mercado, externando sua real identidade.

Nesse meio tempo eu surgi do nada na vida das pessoas, eu cheguei e falei eu sou A FÁBRIS, eu sou uma figura de carne, osso, sentimentos. Uma pessoa que tem dias ruins, alguém que tem seus dias bons. Eu sou a Fábris, aquela pessoa que você deve conhecer. Eu sou a verdade, eu sou alguém que não desistiu, e que de verdade apesar de acreditar que poderia ser tarde seguiu em frente.

Eu sou a designer, a colunista, a podcaster, a youtuber. Eu sou quem quero ser, eu sou a que as pessoas podem enxergar. É fascinante o olhar de interrogação das pessoas. É difícil as vezes se sentir centro das atenções, mesmo que você só queira ser mais uma na multidão. Ser eu mesma é estar preparada para ouvir o que não quer ou mesmo ofendida e ainda assim seguir em frente. Ser real é isso, a gente não sabe o que pode acontecer, mas tem certeza que foi uma decisão nossa.

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Fabris Martins, mulher trans, publicitária, designer e podcaster.