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Identidade de gênero não é brincadeira, mesmo no carnaval

21 de fevereiro de 2020

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Identidade de gênero não é brincadeira, mesmo no carnaval

O carnaval se aproxima, milhares de pessoas vão as ruas, muitas passam semanas produzindo fantasias, se organizam com amigos para irem a blocos e extravasar muitos de seus desejos e fantasias.

Para pessoas transgênero não é diferente, mas ao contrário do primeiro grupo citado, é um momento para tirar a fantasia que a sociedade hétero cisnormativa impõe.

Não é raro que pessoas trans, que por vários motivos ainda estão presas, sejam obrigadas a usar um jaleco social, um uniforme cis que não lhes cabem. Não quer dizer que todo homem que coloca um vestido surrado e passa um batom de forma caricata é uma pessoa trans em potencial.

Aliás isso tem uma conotação muito errada e ofensiva.

São recorrentes os casos de homens que durante o ano todo agem de forma machista, homofóbica e misógina e no carnaval colocam roupas femininas pra zombar ainda mais de mulheres, sejam elas cis ou trans. É impressionante como isso é normalizado, como a sociedade aceita isso de forma natural. Parece que eles têm na cabeça que se vestirem assim é uma forma de mostrar uma superioridade que no fim das contas não existe.

Os defensores dessa atitude sempre usam o velho clichê que carnaval é tempo de alegria, de quebrar regras de conduta. O engraçado da transgressão é apenas mais uma forma de zombaria e de humilhação aos menos favorecidos.

E não adianta usar o velho argumento de” nossa eu respeito muito a luta feminista e trans, tanto que minhas amigas que me produziram”. Isso não te dá o direito de agir dessa forma, usar esse discurso para validar o próprio machismo é mais um sinal de que tudo está errado.

Outro discurso bem difundido é que o politicamente correto acabou com o carnaval.

Normalmente quem fala isso é a mesma pessoa citada acima, que só sabe fazer graça com pessoas menos favorecidas. Normalmente alguém que é coberto de privilégios e acha que pode fazer sempre o que quiser.

Lembrem-se de que as mulheres no Brasil recebem menos para exercer a mesma função que um homem, recebem menos oportunidades de cargos de chefia, são abandonadas, mortas e estupradas. Quando um homem se veste de mulher ele está jogando na cara da sociedade todo menosprezo que ele tem pelas causas feministas.

No fim das contas é tudo uma forma de invalidar e invisibilizar a luta diária de milhares de ativistas que lutam para que os direitos das mulheres sejam respeitados, para que pessoas trans possam viver sem o medo de serem agredidas no dia a dia. Portanto, na hora de escolher uma fantasia pense em quão você é privilegiado em não ser zombado por ninguém no carnaval.

Fabris Martins, mulher trans, publicitária, designer e podcaster.