Lei Maria da Penha agora também protege mulheres trans
No ano de 2006 a Lei Maria da Penha foi um grande avanço.
Maria da Penha é uma farmacêutica que foi vítima de violência doméstica e lutou na justiça por mais de 19 anos pela condenação de seu ex-marido e agressor, ficando paraplégica em decorrência destas agressões. Por meio da lei que leva seu nome, as mulheres conseguiram, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, gozar dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas direitos e garantias a fim de assegurar uma vida sem violência doméstica.
Por vários anos a lei foi um dispositivo de proteção, uma norma a ser aplicada em casos de violência doméstica ou familiar contra pessoas do sexo feminino. Dessa forma medidas protetivas eram acionadas pelo Estado para que se mantivesse a segurança da mulher agredida ou ameaçada.
Marco histórico
No dia de 5 de abril de 2022, quase 16 anos após sua promulgação, mulheres trans e travestis tiveram reconhecido o mesmo direito, por meio de uma equiparação decorrente de uma ação judicial no Superior Tribunal de Justiça, STJ. Mais um passo foi dado, mais uma vitória nos foi reconhecida. Esperamos que não tenha sido a última, pois nossa luta não se resume somente a isso.
O STJ rechaçou o argumento da corte paulista que a Lei Maria da Penha só poderia ser aplicada para pessoas do sexo feminino, desconsiderando o conceito de identidade de gênero. O que por si só já demonstra o preconceito que pessoas trans sofrem de instituições públicas.
Nossa vivência é posta em xeque todos os dias. Nosso existir é sempre pauta de ações judiciais. Mesmo que não seja vinculante, o caso abre precedente para outras ações similares. Nós temos de ter em mente que enquanto não tivermos equiparação, enquanto não tivermos igualdade de direitos corremos ainda mais riscos.
Surpresa
Causou estranheza em a demora da equiparação, pois inúmeras pessoas não sabiam que não éramos contempladas pela Lei Maria da Penha. No Brasil infelizmente sermos trans e travestis é uma sentença de abandono, seja social, seja pelo Estado.
Lembramos que apenas ano passado segundo dados da ANTRA, Associação Nacional de Travestis e Transexuais, foram mais de 140 mortes, muitas delas se encaixando como feminicídio. Estarmos tão vulneráveis mostra a importância do reconhecimento de nossa existência.
Devemos considerar que a violência contra mulheres trans é um crime praticado no mesmo contexto cultural que norteou legisladores a editarem a Lei Maria da Penha. Sendo assim porque não sermos contempladas?
A decisão da Sexta Turma do STJ, vem corrigir um erro histórico. Infelizmente como disse anteriormente, ela pode não ser acatada por outras instâncias da Justiça. Mas, é um apontamento para que possamos reivindicar nossos direitos.
Justiça
Nada mais justo e necessário que finalmente tenha sido reconhecido tal equiparação. Devemos sempre lembrar que conceder direitos às mulheres trans e travestis não retira direitos de outras mulheres. Cabe agora ao Estado promover ações que façam a lei ser cumprida como se deve.